que a memória do inominável apodreça

Tornou-se hábito por parte daquela parcela da população mais ou menos identificada com o campo progressista se referir ao golpista Jair Bolsonaro por meio de apelidos debochados: Bozo, Biruleibe, Biroliro, Saco de Cocô, entre outras variações. Ainda que eventualmente adote uma ou outra destas alcunhas, sinto que elas sejam generosas demais com personagem tão desprezível. Trata-se, afinal, de um sujeito asqueroso, chucro, deselegante e responsável pelas violências mais absurdas direcionadas a parcelas significativas da população brasileira. Alguns destes apelidos amenizam a desgraça que é sua existência. Não há motivos para eufemismos: este sujeito irresponsável está ligado à morte de 700 mil pessoas em função de sua negligência e omissão no combate à pandemia — e não bastando tais violências, esforçou-se para inviabilizar o voto dos brasileiros mais pobres, com o desejo de manter-se indefinidamente no poder à revelia da vontade popular.

Há outro seu apelido, contudo, que me parece bastante adequado: inominável.

Eu quero você (1966), obra de Marcelo Nitsche, em exibição na exposição MEME: no Br@sil da Memeficação (Centro Cultural Banco do Brasil, 2025)

esquecer para lembrar

Há quem se refira ao golpista como “inominável” por mero deboche — por vezes é também meu caso. Contudo, muitos são aqueles (e eu me incluo neste grupo) que preferem utilizar essa denominação por um motivo simples: a mera menção ao nome dessa criatura desprezível é suficiente para alimentar gatilhos traumáticos. Ao longo do período em que este golpista permanecera na Presidência da República fomos sistematicamente atacados, todos os dias, por depoimentos e atitudes cada vez mais absurdas. Era uma agonia contínua, uma ansiedade permanente, uma sensação angustiante de que estávamos lentamente morrendo sufocados num poço repleto de violência, de desprezo por quem pensa diferente, pelos corpos desviantes e pelas formas de vida distintas daquela guiada pela adágio fascista “Deus, pátria e família”.

Todos os dias um novo pronunciamento mórbido. Todos os dias a expressão da omissão, do ódio, da irresponsabilidade. Todos os dias a notícia de que mais gente morreu pela falta de vacina ou pela irresponsabilidade em propagar absurdos médicos como aqueles associados à cloroquina. Todos os dias o contato com a morte (em alguns casos, contatos próximos demais, desesperadores demais).

É urgente uma política de memória, verdade, reparação e justiça. Memória para que não esqueçamos jamais dos absurdos cometidos ao longo daqueles anos — e para que nunca mais essas graves violências se repitam. Verdade para que, de forma ampla e transparente, sejam abertos os arquivos e sejam reconhecidos seus responsáveis e os métodos pelos quais se perpetraram tais violências. Reparação e justiça para todas as vítimas — devidamente reconhecidas como tal pelo estado brasileiro. Mas reparação e justiça também para os criminosos.

Nesse sentido, lembrar é importante, mas esquecer também. Se o tratamos por inominável, é para expressar nosso desprezo. Para que a memória dessa criatura asquerosa apodreça. Para que sua figura nunca mais seja celebrada. Para que sua existência permaneça pequena e asquerosa. Que possamos lembrar daqueles que sucumbiram às violências perpetradas por essa gente, que possamos sempre celebrar suas memórias. Mas do inominável não. Para esse sujeito e toda sua corja não há perdão possível.

que sejam abolidas todas as prisões — menos para o inominável e sua corja

Nesta semana será concluído o julgamento do núcleo duro da tentativa de golpe de estado promovida após as eleições de 2020, quando o voto da maior parte da população — e sobretudo da parcela mais pobre do país — foi atacado por uma corja desprezível formada por homens brancos e ricos liderados pelo inominável.

Embora eu seja muito simpático à tese do abolicionismo penal, desejo do fundo do coração que essa corja apodreça na prisão mais imunda — e que seu líder inominável sofra até os últimos de seus dias miseráveis.

O país precisa dessa catarse. O país merece essa catarse.

Os torturadores e os generais da ditadura civil-militar nunca foram punidos. Os responsáveis pelas violências da pandemia no Brasil nunca foram punidos. Que essa corja golpista enfim seja devidamente responsabilizada e punida.

Que o inominável e sua memória apodreçam.

Um comentário em “que a memória do inominável apodreça”

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.