repostagem: bo bardi, museus e ‘projeto de utopia experimental’

originalmente publicado em http://stoa.usp.br/gaf/weblog/43084.html no dia 22 de fevereiro

Postado por gabriel fernandes

lina

Em outubro de 1991, a revista Caramelo (número 3) publicou uma entrevista com a arquiteta Lina Bo Bardi. Provavelmente foi a última entrevista da arquiteta antes de seu falecimento, no ano seguinte, tendo sido realizada enquanto ela e sua equipe elaboravam o projeto da Nova Prefeitura de São Paulo, no Parque D. Pedro II, a pedido da então prefeita Luiza Erundina – que encabeçava o primeiro governo democrático e popular na cidade. A entrevista foi conduzida pela estudante Carolina Lefévre e teve também participação de Marcelo Ferraz.

Como sempre, as respostas dadas por Lina são concisas, certeiras, graciosas.

Seguem alguns trechos (todos os grifos são meus):

(…)

Você teve problemas com a ditadura militar que aqui se instalou em 1964?

A ditadura é civil e contínua. Eu tive problema com o 2o Exército que me julgava subversiva, apesar disto no meu depoimento nada declarei contra o mesmo. E hoje? Temos figuras patéticas no poder. Cabe à geração de vocês tomar providências, mas a revolução não está mais na moda.

Lina, por que você afirma que a arquitetura popular representa um valor de liberdade?

O povo tem sempre um valor de liberdade e em geral representa a força de um país, mas não como folclore e no Brasil ele está marginalizado. Os problemas do Brasil são sócioeconômicos.

Você acha que quem está começando hoje ainda pode fazer coisas?

Depende de você, da sua força, do tipo de coisa que você quer fazer. São as casas da madame? Então você vai fazer piscina, discutir as cores da cortina da casa e fazer a casa do cachorro. Mas eu me sinto como na época em que me formei, quando tive uma depressão terrível de pensar que se eu abrisse um escritório alguém iria bater na minha porta e perguntar: "Quer fazer uma casa para mim?". Porém, você pode enveredar por um caminho mais difícil.

(…)

Qual sua concepção de Museu?

Eu sou contra os Museus e vou citar Maiakovsky: "Está na hora que os projéteis e as bombas batam nas paredes dos Museus."

Por quê?

Porque acho os Museus inúteis. O Masp não é um museu, é uma reunião de coisas importantes que surgiu num momento em que os países da Europa estavam falidos e os grandes colecionadores estavam em dificuldades. Então foi possível para o Chateaubriand, com a força da imprensa, tirar o dinheiro dos ricos para fazer o Museu.

(…)

Qual a importância do Centro de Lazer do Sesc Pompéia?

Este é o tema do projeto, mas era mais voltado para a terceira idade, com os anciãos que dançavam em sala fechada porque tinham vergonha de serem velhos. Aí nós abrimos as portas e os jovens dançavam com os velhos e as crianças passavam entre as pernas. Alguém disse: "é uma pequena experiência socialista", quer dizer, deu resultado. Então a função do arquiteto não é a de fazer somente um prédio bonito, mas também de comportamento social. E isso de dizer que a Arquitetura Moderna falhou em sua missão não é a pura verdade, há outras "histórias" no meio e grandes histórias – o futuro falará

referência: lefévre, carolina; "entrevista – lina bo bardi" in revista caramelo, n. 3; são paulo: gfau, outubro de 1991.

***

Em tempo: "museu" da FAU em setembro de 2008:

fau invadida

 

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