Prestes Maia lendo edição da revista Quatro Rodas entregue por Victor Civita

prestes maia sobre brasília

O primeiro texto da antologia organizada por Julio Katinsky e Alberto Xavier dedicada à cidade de Brasília (publicada pela Cosac Naify em 2012) é de Prestes Maia. Trata-se, cabe lembrar, do ex-prefeito e planejador de São Paulo responsável pelo mítico Plano de Avenidas da cidade.

O texto é irritantemente datado — não pelos argumentos contrários à mudança da capital (alguns dos quais, aliás, permanecem relativamente atuais), mas pelos terríveis, explícitos e absurdos preconceitos elitistas e misóginos expressos pelo urbanista.

Diz Prestes Maia:

(…) temos visto governantes, deputados, generais, etc. vibrarem à ideia de uma remoção em massa para os monótonos cerrados centrais, assim como dirigiram objurgatórios aos incréus dos méritos dessa província. Uns descobriram que no planalto, pela virtude da altitude, todo mundo ficará “bonzinho”. Os políticos não farão mais tratantadas, os funcionários serão os primeiros a reclamar a hora de trabalho, os contínuos recusarão gorjetas, as moças desprezarão empregos públicos, os estroinas esquecerão as “boites”, nos cassinos se jogará dominó e assim por diante.

MAIA, Francisco Prestes. Mudancistas e fiquistas. In: XAVIER, Alberto; KATINSKY, Julio (orgs.). Brasília: antologia crítica. São Paulo: Cosac Naify, 2012, pp. 21–27. (originalmente publicado na revista Brasil — Arquitetura contemporânea, n. 10, 1957, pp. 10–13)

Em um único parágrafo introdutório de seu texto Prestes Maia conseguiu ser um grandessíssimo escroto preconceituoso com as mais variadas categorias de indivíduos desviantes do típico homem branco de classe média devoto e sóbrio. E por mais que o texto tenha à época sido escrito com evidente intenção de deboche, ainda causa certa perturbação pensar que apenas meio século atrás tantos absurdos liam-se cotidianamente nos jornais — Prestes Maia, afinal, fazia aí o papel de intelectual público dirigindo-se ao grande público a respeito dos supostos equívocos da mudança da capital do país. Ainda bem que o Brasil mudou, não?

Imagem: Quem foi Francisco Prestes Maia?

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