originalmente postado em http://notasurbanas.blogsome.com/2010/04/25/mcdonalds-desenho-de-uniformes-e-organizacao-do-trabalho/
Uma das atividades a que se submeteu Günter Wallraff quando da preparação de seu livro-reportagem Cabeça de turco [1985] foi a de empregado em uma filial do McDonald’s em Hamburgo. Diz ele (o destaque é meu):
Igual aos hambúrgueres, também sou embrulhado com as embalagens da casa: boné, camiseta e calça. Nos três, o logotipo do McDonald’s. Só falta me colocarem na grelha. A calça não tem bolsos. Se recebo alguma gorjeta, corro a mão inutilmente pela costura lateral até que, por fim, coloco o dinheiro exatamente onde a empresa quer tê-lo: dentro da caixa registradora. O golpe de mestre da calça sem bolsos também impede que tenhamos um lenço. Portanto, se “o nariz escorrer”, vai escorrer por cima dos hambúrgueres ou provocar chiados sobre a grelha a cada pingo. [p 38]
Mais adiante:
Depois de passar pela fritura, pela chapa e pelo atendimento de balcão, sou iniciado, no terceiro dia, na técnica dos “serviços de balcão”: recolher as embalagens e limpar os restos de comida deixados sobre as mesas. Para essa tarefa, entregam-me dois panos: um para as mesas e outro para os cinzeiros. Na pressa costumeira, frequentemente os confundo. Mas ninguém se importa. Muitas vezes limpamos os banheiros com os mesmos panos. É a forma de encerrarmos o ciclo de alimentação. O que me dá nojo. Porém, se peço outro pano, respondem-me com arrogância que os que tenho já são mais que suficientes. [p 43]
Finalmente:
Através de uma circular escrita há seis anos, o chefe de departamento do pessoal dá o seguinte conselho a todos os McDonald’s da Alemanha Ocidental: “Se durante uma entrevista com um candidato ficar comprovado que ele é ‘politizado’, faça-lhe outras perguntas e pare por aí. Prometa-lhe uma resposta para alguns dias depois. E naturalmente não o contrate em hipótese alguma”.
[…] Abrams, general americano, considera o McDonald’s uma escola-modelo: “É muito saudável para um jovem trabalhar no McDonald’s. O McDonald’s faz dele um homem eficiente. Se o hambúrguer não está bom, o sujeito é posto na rua. Esse sistema é uma máquina que funciona silenciosamente, e nosso Exército deveria inspirar-se nele.” [pp 44–46]
Fonte: WALLRAFF, Günter. (1985) Cabeça de turco. São Paulo: Editora Globo, 14ª edição (2007), pp 38–46.