easter eggs arquitetônicos em The Legend of Zelda: Breath of the Wild

The Legend of Zelda: Breath of the Wild (BotW) foi considerado o melhor jogo de 2017 pelo Game Awards, principal premiação do meio de jogos eletrônicos. Com formato de mundo aberto, em BotW o jogador assume — como é usual nesta série — o papel de mais uma versão do personagem conhecido como Link em sua recorrente missão de livrar o mundo ficcional de Hyrule da ameaça do vilão conhecido como Ganon, contando com a ajuda da princesa Zelda (mencionada no título da série) no processo. Buscando se apresentar como um produto direcionado à família, o jogo não possui maiores sofisticações temáticas ou estéticas e é vendido para todas as idades: bem produzido, modelado e detalhado, possui uma mecânica e jogabilidade bastante simples e algo intuitiva — praticamente um filme em animação da Disney na forma de jogo eletrônico.

Apesar do roteiro elementar e tradicional — trata-se, afinal, da clássica e mastigada história do herói predestinado a salvar o mundo que percorre uma jornada de crescimento pessoal e acúmulo de experiência ao fim da qual ele livra sua terra do mal que a acometia —, o título permite ao jogador descobrir e construir uma experiência saborosa e divertida, marcada eventualmente por alguns detalhes secundários interessantes e engenhosos, entre os quais algumas curiosidades arquitetônicas descobertas ao longo do caminho de Link. O jogo é caracterizado por um enorme território plenamente explorável, constituído de regiões florestais, desérticas, campos, áreas nevadas, bem como vilas e outros tipos de assentamentos. Ainda que os requintes encontrados em seus easter eggs não sejam tão sofisticados (ou literais) quanto aqueles de outros jogos, vale a pena olhar para algumas delas.

1. um spiral jetty nas praias de Akkala

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Na região de Akalla, nas regiões a nordeste do mundo de Hyrule, é possível se deparar com uma formação de terra em espiral que avança sobre o mar, lembrando em tudo o célebre Spiral Jetty de Robert Smithson. Diferente da obra de Smithson, porém, ao centro desta espiral revela-se um santuário — um entre os 120 que o protagonista do jogo deve procurar ao longo de sua jornada.

Seria certamente forçosa e mesmo exagerada qualquer tentativa mais sofisticada de comparar a espiral do jogo com a de Smithson — obra das mais famosas da assim chamada “land art” e representativa do cânone artístico dos EUA no século XX —, contudo, esta marca na paisagem virtual do jogo funciona como uma espécie de índice de tempos passados evocados ao longo de sua narrativa: com a devida licença poética, não deixa de ser curiosa alguma convergência com o desejo de Smithson de explorar e brincar em seu Spiral Jetty com tempos geológicos, paleontológicos e astronômicos em sua intervenção na superfície do planeta.

2. casas modulares em madeira

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Enquanto explora a vila de Hateno, Link eventualmente encontra uma espécie de “novo loteamento” aberto à visitação e compra de unidades residenciais. Iniciativa da Bolson Construction Company, a área é repleta de casinhas modulares aparentemente pré-fabricadas em madeira. Em um cenário que toma por inspiração uma idealizada e romantizada Idade Média, essas casinhas pré-fabricadas não deixam de ser um adorável  e gracioso anacronismo. O ímpeto imobiliário e expansionista da Bolson Construction Company é tal, aliás, que a empresa chega mesmo a incorporar um vilarejo inteiro, construindo-o do nada: trata-se de Tarrey Town, talvez a primeira cidade planejada e pré-fabricada da história de Hyrule. Jean Prouvé morreria de inveja.

3. arquitetura-pato — ou: “arquitetura-cavalo”

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É célebre a distinção construída por Robert Venturi e Denise Scott Brown entre as arquiteturas que podem ser classificadas, de um lado, como decorated sheds e, de outro, como ducks. Se o casal vivesse no mundo de BotW, porém, eles provavelmente usariam cavalos em vez de patos para construir a analogia.

Ao longo de sua jornada pelas terras de Hyrule, Link cruza com uma série de construções espalhadas pelo território que funcionam ao mesmo tempo como pousadas para os viajantes e estábulos para guardar seus cavalos. Esta função dos edifícios é evocada claramente pela engenhosa forma que suas tendas assumem, simulando a cabeça de um cavalo — talvez melhor exemplo não haja de arquitetura-pato segundo a lógica venturiana.

Curiosamente, a função expressa dos edifícios também é explicitada pelos covis dos vilões e monstros do jogo, materializados em construções com formato de caveira.

4. climatização no deserto: lâminas d’água em coberturas

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Em certo momento de sua jornada, Link precisa explorar a cidade do povo Gerudo — a versão do jogo para as amazonas da mitologia e dos quadrinhos, já que se trata de uma cidadela de mulheres guerreiras na qual a presença de homens é proibida.

A cidade é apresentada no meio de um enorme deserto — o jogo inclusive possui mecânicas que afetam o personagem em função do calor excessivo. No entanto, o interior da cidade é caracterizado por temperaturas amenas: construída segundo a clássica tipologia dos jardins úmidos da arquitetura mourisca (ainda que modelada de forma um tanto caricata), a cidade das Gerudo reúne todas as suas construções sob um intrincado sistema de aclimatação. Todas as edificações compartilham uma grande cobertura de lâmina de água.

Como se sabe, a existência de lâminas de água sobre tetos planos ajuda a aumentar a inércia térmica da cobertura de uma edificação, controlando as variações bruscas de temperatura em sua superfície. As construções possuem pequenas aberturas e suas janelas possuem até mesmo muxarabis: em uma de suas missões, Link precisa espionar um grupo e os muxarabis revelam-se perfeitos para escutar escondido conversas alheias.

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