Ensinar (ou fazer arquitetura…) exige saber escutar:
Sempre recusei os fatalismos. Prefiro a rebeldia que me confirma como gente e que jamais deixou de provar que o ser humano é maior que os mecanicismos que o minimizam.
A proclamada morte da História que significa, em última análise, a morte da utopia e do sonho, reforça, indiscutivelmente, os mecanismos de asfixia da liberdade. Daí que a briga pelo resgate do sentido da utopia de que a prática educativa humanizante não pode deixar de estar impregnada tenha de ser uma constante.
Quanto mais me deixe seduzir pela aceitação da morte da História tanto mais admito que a impossibilidade do amanhã diferente implica a eternidade do hoje neoliberal que aí está, e a permanência do hoje mata em mim a possibilidade de sonhar. Desproblematizando o tempo, a chamada morte da História decreta o imobilismo que nega o ser humano. […]
[…] é preciso que quem tem o que dizer saiba, sem dúvida nenhuma, que, sem escutar o que quem escuta tem igualmente a dizer, termina por esgotar a sua capacidade de dizer por muito ter dito sem nada ou quase nada ter escutado.
Por isso é que, acrescento, quem tem o que dizer deve assumir o dever de motivar, de desafiar quem escuta, no sentido de que, quem escuta diga, fale, responda. É intolerável o direito que se dá a si mesmo o educador autoritário de comportar-se como o proprietário da verdade de que se apossa e do tempo para discorrer sobre ela. Para ele, quem escutar sequer tem próprio pois o tempo de quem escuta é o seu, o tempo de sua fala. Sua fala, por isso mesmo, se dá num espaço silenciado e não num espaço com ou em silêncio. Ao contrário, o espaço do educador democrático, que aprende a falar escutando, é cortado pelo silêncio intermitente de quem, falando, cala para escutar a quem, silencioso, e não silenciado, fala.
[…] Não há inteligência da realidade sem a possibilidade de ser comunicada. […]
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996, pp 115–118
Retomam-se neste trecho de Pedagogia da autonomia temas discutidos duas décadas antes de sua redação em Extensão ou comunicação?, livro que reúne as reflexões de Freire sobre trabalhos de extensão agrícola.
O direito à palavra surge como consequência da luta pela leitura do mundo e sua escrita. A autoridade da palavra só faz sentido quando produzida com os outro e não para os outro. A autoridade própria da autoria da palavra leva necessariamente à constante busca pela superação da dicotomia ideológica autor—executor. Transpor a obra instigante de Paulo Freire ao universo da arquitetura demanda reflexões mais bem desenvolvidas, é preciso evitar transposições automáticas ou literais. Mas a provocação que Freire nos coloca é sempre — além de mobilizadora, instigante —, fundamentalmente, bela.